sábado, 23 de julho de 2011

Relato de Parto Carol / Nascimento de Nara - Lindo de Viver!!!!


RELATO DE PARTO DOMICILIAR

Por Shirley Caroline

Uma vez escrevi que tudo começa na segunda-feira e nas manhas das manhãs. E foi assim que começaram os primeiros sinais da vinda de Nara.
O relógio indicava 7hs, dia 13 de Junho de 2011, dia de Santo Antônio. Acordei com os sentidos voltados para o meu corpo. Por isso mesmo, já sabia que era chegada a hora. Fiquei tranqüila. Em meu pensamento as palavras de um amigo eram todas repetidas “o corpo é sábio” – e acreditei. Ao perceber que as leves dores de cólica persistiam quando em vez, liguei para a parteira Danieli Siqueira, às 10h. Foi estabelecida a comunicação. Com a confirmação de Dani, de que era a “boa hora”, entrei no quartinho de Nara, conversei com ela e orei aos espíritos amigos. Às 14h30, como um sistema de conjuntos, meu quarto estava na casa vazia, a cama estava no quarto, eu estava na cama, a barriga em mim, Nara na barriga, mas não nadava mais. Um quentinho jorrava entre as minhas pernas. Em pouco tempo já estava a sentir náuseas e irritação porque, ali, eu havia penetrado no meu mundo, o qual havia se tornado restrito.  Eu estava adentrando a Partolândia...
Pela janela do quarto, vi Dani de braços dados com Dona Prazeres entrando pelo portãozinho. E eu olhei para aquele serzinho de quase um metro e meio com o coração palpitando de felicidade. Havia Rebeca e havia Tatiana, doula. Eu sabia que não estava mais sozinha. Sabia que a partir daquele momento era a pessoa mais segura do universo e que todos os meus desejos seriam respeitados. Estava caminhando para um parto natural, ativo, humanizado, trazendo minha filha da melhor forma possível a este mundo, com respeito e entrega que é o princípio do amor.
Meu último desejo foi um pedaço da manga que Rebeca estava fatiando. Não precisei falar que queria, ela ofereceu como quem está em sintonia absoluta. Recordo das caminhadas e abraços tranqüilizadores de Tati, respirando comigo o tempo todo. De olharmos a lua, no céu, plena em seu último dia de lua crescente; crescida, enfim. Lembro do olhar seguro e a voz doce de Dani, mostrando a realidade com entrelinhas do “eu-confio-em-você” e o olhar tão vencido pelo tempo, de dona Prazeres, o qual me respondia perguntas que nunca pronunciei naquela noite. Noite que estava linda, com um clima agradável, muitas estrelas. Nossa casa estava com apenas uma ou duas luzes acesas e todos os presentes possuíam a sensibilidade de me deixar à vontade e se aproximarem nas exatas horas certas.
O avanço das contrações ocorria em segredo com a imagem do quadro que Dani me pintou. Eu via a imagem de um pôr-do-sol se misturando com a areia de um deserto aonde brotava de uma montanhazinha de areia uma pequenina flor vermelha, simplória, de apenas três pétalas, sobrevivendo no meio do nada, querendo acordar como a rosa do pequeno príncipe. Era o meu útero dilatando...
Com a chegada do papai de Nara, Martins, tive muita ajuda, mas às vezes precisava de Tati para me lembrar como respirava e segurar em minha mão. Ele não estava totalmente preparado por isso não entendia a importância, mas ele acreditava em mim e aprendeu ali, no decorrer do processo a ser um excelente companheiro-pai.  Um momento bastante importante da sua presença se deu quando Dani e dona Prazeres deram o único toque do trabalho de parto. Foi em minha cama, no quarto que um dia foi da mãe de Martins e então era nosso e Nara nasceria nele. Martins deitou ao meu lado e segurou em minha mão, enquanto Dani e Dona Prazeres verificaram a dilatação acompanhada de uma excelente notícia: às 20h30 eu já estava com quase 8 de dilatação! Merecia descanso e fiquei alguns minutos deitada com Martins ao meu lado, sozinhos. Foi ali que fizemos as pazes com o antes.
As contrações foram ficando cada vez mais fortes. O corpo queria expulsar tudo! Fazer uma faxina. Exercícios, caminhadas, bola e uma vontade terrível de evacuar. Era hora de ir para a piscininha. Narinha viria das águas! Todos ansiavam a sua chegada e Dani dizia que estava no 3º estágio.  Logo, a banqueta estava dentro da água. A cada contração, Martins me suspendia e Dani protegia o meu períneo o que dava ainda mais vontade de evacuar, mas eu não sabia direcionar a força do evacuar e a prendia em minha garganta. Por um momento entrei em desespero, dei dois gritos e quase chorei! Neste momento, por alguns segundos, quase desacreditei em meu corpo, foi então que todos se aproximaram mais para ajudar. De repente, Martins e Dani estavam dentro da piscina. Com auxílio das parteiras a cabecinha de Nara saiu e para o corpinho só precisou de uma única força. Eu estava curada da lembrança remota do meu nascer e da episiotomia traumatizante da minha mãe.
Apressadamente, Dani colocou, com um lindo sorriso no rosto, Nara em meus braços. A sensação é indescritível. Parece clichê, mas não recordo de possuir tanta felicidade antes, em toda minha vida! Dois olhinhos de bola de gude me olhavam, logo fechavam, como de japinha, para chorar. As parteiras deram as mãos. Havia abraços e sorrisos. Havia Martins, atrás de mim, com olhos de “ufa!”. Dani me deu um grande beijo na testa, Narinha a consagrava parteira e eu dava vivas pela minha cumadre!
Foi assim que Nara chegou naquela noite de 14 de Junho de 2011, às 00:52, pesando 3.750kg e medindo 55cm, sob o signo de gêmeos, com ascendente em áries e lua em sagitário, como a mãe. Seu bracinho estava enganchado no cordão umbilical. A primeira palavra que eu disse, antes dela chorar, foi “seja bem vinda a este mundo, minha filha!” e a trouxe para o seio esquerdo. O cordão parou de pulsar rapidinho, só depois o papai dela o cortou. Em seguida, Dani a limpou e a levou para conhecer o seu quarto e a sua casa (com exceção dos banheiros). Nara observava tudo, atenta e em silêncio.
O que eu pensava acontecer em segredo, não era tão segredo assim. Na casa ao lado, outras pessoas esperavam Nara com lágrimas, ansiedade e orações. Minha mãe, a madrasta e a irmã do papai, vieram como os três reis magos, guiadas pelo choro, conhecer Narinha.
Ficamos, por alguns minutos, afastadas por paredes. Enquanto Nara conhecia sua família, eu expulsava a placenta. A placenta descolou rapidamente do útero, mas era muito grande e a dor não era nada amiga. No entanto, bastou uma única força, na banqueta, para que ela fosse expulsa. Ela era do tipo raquete, dona Prazeres disse. Comi um pequeno pedacinho com molho shoyo, para recuperar as energias e os demais restos foram enterrados na frente de casa, no dia seguinte, pelo vovô e papai, no que um dia será um pequeno jardim e  hoje há tanto abandono.
A maior surpresa ficou para o final – meu períneo estava íntegro! Curei a mim e a minha mãe do trauma causado pelo meu parto há 24 anos antes. Minha mãe... Tentei levá-la aos encontros de gestantes diversas vezes, sem sucesso; após a chegada de Nara ela tornou-se uma defensora , a olhar o parto humanizado com outros olhos e sei que a mim, também. 
Por fim,
Às 3hs da manhã a casa ficou com o nosso silêncio: meu, de Nara e de Martins, que fazia a vigília do sono dela, enquanto eu descansava um pouco. Ele a pegou nos braços, levou para o berço, olhou da porta do quarto, voltou, a pegou nos (a)braços, trouxe para a cama, trocou a primeira fralda. Havia um brilho em seus olhos, daqueles de quando a gente se apaixona. Ele estava se tornando pai. E quando abri meus olhos, duas ou três horas depois, ele estava na mesma posição, fixando o olhar no mesmo objeto. Nara olhava tudo lentamente com olhinhos de bola de gude, conhecendo e se deixando conhecer. O mundo se limitava todo ali, naquela cama de casal em que cabia três.
Dentro de mim, meu coração batia mansinho e quietinho, batucando um samba como uma prece, agradecida a todos os espíritos amigos, materiais ou não. Eu estava aliviada. Muita coisa iria começar, mas muitas outras também iriam terminar. Era o nascimento de Nara, mas também era o renascimento de Carol, o nascimento de uma mãe.

Seja bem vinda, minha filha!
Mamãe já ama.



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